ONG
transforma morador de rua em ponto ambulante de internet
Em Praga, na
República Tcheca, iniciativa gerou apoio e críticas.
Dinheiro para manter a iniciativa vem de doações virtuais.

Em Praga, sem-teto vira ponto de
wifi com ajuda
de ONG (Foto:
Reprodução/Facebook/Wifi4Life)
Uma organização de caridade de Praga, na República
Tcheca, criou uma maneira inusitada de ajudar na integração dos sem-teto com o
restante da sociedade: transformá-los em "hotspots" ambulantes para
oferecer internet gratuita, ideia que para alguns soou como uma grande sacada,
mas para outros não passa de exploração de mão de obra.
Logo que o dia começa, integrantes da ONG Wifi4Life
entregam a um morador de rua um roteador e uma bateria para recarregar
celulares, que ele deve deixar no bolso de seu casaco.
Depois, o "ponto de internet ambulante" deve
circular por locais turísticos ou conhecidas regiões de Praga, sempre em um
raio de ação de 100 metros, podendo estar sentado em um banco ou mesmo parado
na entrada de uma estação de metrô, por exemplo.
Além dos aparelhos, o morador de rua usa uma camiseta
com a inscrição "Free Wifi Charity" , explicou Lubos Bolecek,
fundador da Wifi4Life. Ele espera que o anúncio na camisa e a campanha na
imprensa e nas redes sociais sejam suficientes para aumentar a percepção
positiva da iniciativa.
"A ideia é boa, é simpática, mas espero que os
sem-teto recebam alguma coisa", defende Robin Kleinhampl, administrador de
um prédio comercial no centro de Praga, onde param muitos moradores de rua, que
em breve poderão oferecer seus serviços de internet.
O problema, para alguns, é a forma de pagar por este
serviço. Por enquanto, o plano da Wifi4Life é assumir as despesas com
alimentação, alojamento, roupas e higiene dessas pessoas, e dar uma quantia em
dinheiro, que a organização estima ser de 400 euros por mês (cerca de R$ 1,6
mil).
No entanto, não existe contrato de trabalho, nem seguro
médico. Entre a Wifi4Life e os sem-teto existe apenas um contrato de empréstimo
dos materiais.
A organização "Nadeje", que atende anualmente
cerca de 3 mil sem-teto, não concorda com este sistema de ajuda. "Em
geral, não apoiamos que uma sem-teto trabalhe sem um contrato formal",
afirmou à Agência EFE o diretor regional da Nadeje em Praga, Jan Kadlec.
Para ele, a iniciativa poderia violar a Lei de Serviços
Sociais, sobretudo no trecho de discriminação e abuso. "É difícil avaliar
o que os moradores de rua recebem como compensação, portanto, é difícil dizer
que é legal", disse.
De fato, existem na capital tcheca outras iniciativas
públicas e privadas, nas quais se assina um contrato, como programas para
varrer ruas e parques, andar com anúncios publicitários e limpar cemitérios.
A Wifi4Life, no entanto, justifica que, se contratasse os moradores de
rua, o projeto custaria o dobro, por conta da elevada pressão fiscal, que chega
a até 50%, segundo Bolecek.
"A propaganda foi veiculada em horário nobre na TV.
A receptividade foi muito boa. Recebemos retorno até da Itália e da Argentina
para que implantássemos o sistema por lá", relatou.
Por enquanto, a Wifi4Life espera arrecadar dinheiro
suficiente através de "crowdfunding" (financiamento coletivo) para
começar a aplicar a iniciativa. Mais adiante, espera que ela se mantenha graças
à "solidariedade" das empresas de telefonia e de fornecedores de
serviços de internet, que comecem a fazer doações.
"Muitas empresas e cidadãos em geral estão dispostos a financiar
os projetos que gostam, e este tem grande potencial de relações públicas, para
unir seu nome a esta iniciativa", resumiu Bolecek.
Ele ressalta que de forma alguma a Wifi4Life aceitará
que os moradores de rua "mendiguem" dinheiro dos usuários. O primeiro
- e até o momento único - sem-teto do projeto piloto é Kamil Krtil, de 56 anos,
que diz estar satisfeito com o trabalho, que ele concilia com o de vendedor de
flores na rua.
"Há dois meses trabalho neste projeto, e é uma boa
ideia", afirmou Krtil, que fica na saída da estação do metrô Dejvicka, ao
lado do campus da Universidade Politécnica de Praga, enquanto cumprimenta
pedestres conhecidos.
Apesar de Praga ter cerca de 6 mil pessoas na mesma
condição de Krtil, poucas cumprem os requisitos para este programa, segundo a
Wifi4Life.
"Nosso segmento são os sem-teto que acabaram na rua
por um problema muito pontual e que precisam apenas de um estímulo para voltar
à vida normal", alegou Bolecek.
De acordo com ele, o objetivo é que uma pessoa que
trabalhe como "hotspot" esteja preparada para voltar ao mercado de
trabalho formal em, aproximadamente, seis meses.
COMENTÁRIOS – Eu acho que seria uma maneira da
sociedade ver os sem tetos de melhor forma. O Governo muitas vezes não ajuda, mas
também atrapalha quem quer ajudar. Essa possível aproximação, entre as pessoas
e o sem tetos nas ruas, praças e parques, seria bom para quem precisa de
internet e para quem gostaria de não sentir sozinho.